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Precauções necessárias

sábado, 12 de novembro de 2011

O primeiro sinal de alerta veio da história familiar, o que provocou o cuidado de tentar detectar a doença precocemente, com exames preventivos constantes. O segundo e definitivo alarme soou em abril deste ano, quando as dores abdominais que Tânia Helena de Carvalho de Oliveira, 44 anos, sentia, se tornaram insuportáveis. Uma ecografia abdominal capturou uma mancha na região pélvica e, pouco depois, uma ultrassonografia transvaginal revelou a existência de um tumor no ovário esquerdo, estacionado na Fase 2 (vai até 4) — ou seja, no limiar de um estágio mais grave.

“Fiquei apavorada, no começo, mas, como a morte é inevitável de qualquer maneira, sentia mais por minha família. Por isso, não pensava muito nisso”, confessa Tânia, sorrindo, acariciando as madeixas de uma peruca com um corte chanel que já teve mechas loiras, cor de cobre, vermelhas. Agora, os fios de cabelos artificiais reproduzem a tonalidade escura da cabeleira negra original que a quimioterapia fez sumir. Sentada em uma poltrona confortável na sala da casa, no Riacho Fundo 1, com um humor contagiante, a administradora de empresas especializada em administração hospitalar, ex-funcionária da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), dá um recado às mulheres: não deixem de fazer exames preventivos, principalmente se houver casos de câncer de ovário na família.

Os especialistas afirmam que apenas 10% das ocorrências desse tipo de neoplasia têm

como fator de risco a genética familiar, mas, quando isso ocorre, o tratamento tem mais chance de êxito. Os outros 90% são classificados como casos esporádicos, decorrentes de diversos fatores. “Como minha mãe (Maria Helena) teve esse câncer e ainda hoje faz tratamento, comecei a me cuidar mais, com exames regulares”, explica Tânia.

Ironicamente, essa herança sombria situa a paciente no seleto time de duas a três mulheres em cada grupo de 10 que obtêm de 70% a 95% de chances de cura. Em maio, após uma bateria de exames, ela obteve o diagnóstico. “Foi o marcador CA 125 que fechou o diagnóstico. O meu estava em 234 (unidades por mililitro), quando o limite é 35. Depois da quimioterapia, chegou a seis”, comemora Tânia. Obtidos os resultados dos exames, ela passou por uma cirurgia para extrair os órgãos do sistema reprodutor e respondeu bem à quimioterapia adjuvante. “O problema desse tipo de câncer é que, em geral, a grande maioria dos casos já nos chegam nos estádios 3 e 4, mais difíceis de tratar. No caso de Tânia, ela se protegeu mais com exames regulares”, explica o oncologista Bruno Carvalho Oliveira, do Grupo Acreditar, que acompanha a paciente.

Perspectivas
Para Fernando Maluf, diretor do Departamento de Oncologia Clínica do Hospital São José, em São Paulo, os exames preventivos disponíveis para rastrear o câncer de ovário na fase pré-maligna não se mostram ainda tão eficazes. “Mas esse cenário pode mudar, com a descoberta de ferramentas de maior precisão, como ocorre hoje nos casos de câncer de mama e de colo de útero”, analisa o médico. Além de um arsenal mais afinado com a tecnologia avançada para investigar a neoplasia na sua etapa inicial, Maluf visualiza boas perspectivas de tratamento mais eficientes com a chegada de novas drogas. Ele se refere a resultados de pesquisas recentes apresentadas no 47º Congresso Anual da Sociedade Americana de Oncologia, em junho deste ano.

Um desses estudos, já em fase de conclusão e em vias de aprovação pelo Comitê da Agência Europeia de Medicamentos (Emea), refere-se ao bevacizumabe (veja infografia) — um anticorpo monoclonal com indicação para outros tipos de câncer, mas que agora poderá seu usado por pacientes com tumores de ovário em estágio avançado. “Esse medicamento retarda a doença por quatro meses, em média. Isso significa que o paciente fica livre dos sintomas, mas esse intervalo pode ser maior, dependendo da resposta ao tratamento de cada um.” No Brasil, a expectativa é de que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprove o remédio até o fim de 2012.

Outros dois medicamentos, olaparibe e iniparibe, ainda na Fase 2, registraram bons resultados nos testes em pacientes que tiveram doença resistente às quimioterapias rotineiras, conta Maluf. O grupo de doentes com câncer de ovário que recebeu as drogas teve um aumento significativo na sobrevida — ela praticamente dobrou. “Essas drogas representam um avanço muito significativo. Mais importante ainda, são medicações bem toleradas, com poucos efeitos colaterais” afirma Maluf.

No Instituto Nacional do Câncer (Inca), o coordenador de Pesquisa Clínica e Incorporação Tecnológica, Carlos Gil Moreira Ferreira, acredita que o bevacizumabe pode ser vantajoso para alguns pacientes, porque retarda a progressão da doença por um determinado tempo, mas é preciso esperar os estudos confirmatórios. “Em bases individuais, desde que se comprove sua eficácia, claro que se justifica a indicação do bevacizumabe, mas é preciso pensar melhor no caso de um sistema de saúde pública. Tem de ser feita uma análise fármaco-econômica bem detalhada para ver se vale a pena.”

Na pista certa
O marcador tumoral CA 125 é uma proteína produzida pelas células ovarianas e, por esse motivo, é largamente usado para investigar cânceres de ovário, de mama e do endométrio. Embora o teste não seja sensível ou específico o suficiente para rastreamento, ele é bastante importante na época do diagnóstico, quando analisado em conjunto com ultrassonografias e exames pélvicos. Durante o tratamento, testes seriados dos níveis de CA 125 podem detectar algum câncer remanescente ou se o câncer retornou. É importante lembrar que o CA 125 normal ou negativo não garante a ausência de câncer. A escala limite do marcador é 35U/ml.